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Este diário é o registo dos últimos dias de uma virgem prometida à morte. Tudo na poesia de Florbela Espanca, poesia concupiscente do uso inteiro das sensações, nos encaminha para esta subida ao zénite da sua realidade arquetípica. Só quando talhada no mármore da morte a sua virgindade essencial, cessará o crescendo do gesto histriónico em que ela encarna o pathos da sua vontade de tragédia. Coquetismo patético com que Bela nos vai atraindo para o espectáculo final: a apoteose suicida do seu exibicionismo. Actriz do seu ser mítico de que está assombrada, Bela representa-se como diva do simbolizante feminino. A frívola dissipa-se na inconstância da sua insaciabilidade, sempre a pedir novos enganos à vida, a provocar o clímax da sua agonia para expirar, na morte, o hálito puro da profunda. Os adereços da sua tragédia têm a futilidade das paixões vãs e fugidias que a consomem; a barateza das jóias de um guarda-roupa teatral: as pérolas do colar com que, nos lances dramáticos da sua sede de ser única, Bela aperta cada vez mais o seu pescoço de cisne até soltar o canto que se requinta quando a ave real dos lagos vai morrer. Esse pechisbeque fulgente do cognato frívolo da sua profundidade sequiosa de infinito - requisito bicéfalo da vigência mítica de que Florbela é sujeito dramático - chispa nas fulgurantes banalidades dos seus versos. Uma poesia maquilhada com langores de estrela de cinema mudo. Carregada de pó-de-arroz. Mas quem espalha essa poalha perfumada é a mão da virgem que nela se envolve para velar a sua intangibilidade. E mais se esconde quanto mais persuasivos forem os ritmos sensuais da fútil.
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